domingo, abril 10, 2005

ROBERTO CARLOS, O REI.

Vou contar um pouco da história de um fantástico brasileiro: Roberto Carlos.
Não, não é o rei que todo final de ano canta na Globo, nem o lateral esquerdo do Real Madrid e da nossa seleção. Esse é Roberto Carlos Ramos, mestre em pedagogia pela Unicamp, pós-graduado em literatura infantil pela Puc-MG e premiado como um dos dez maiores contadores de história da atualidade pela Associação Internacional de Contadores e Valorizadores da Expressão Oral, sediada nos Estados Unidos. Seu histórico durante a infância e a juventude não é das mais brilhantes: mais de uma centena de fugas da Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) de Minas Gerais, começou a usar cola aos 11, maconha anos depois e roubou nas ruas de Belo Horizonte. Sua vida até aquele ponto se resumia a: roubar, usar drogas, ir para a Febem, fugir de lá e roubar mais, respeitando sempre os idosos e as gestantes, segundo Roberto Carlos. Ele não sabia o que queria ser quando crescesse. Pensava que os maus tratos que recebia eram por não ter uma resposta correta para pronunciar. Um dia, resolveu falar, inspirado num filme, que queria ser astronauta. Sentiu-se feliz da vida ao notar que a professora, satisfeita com a declaração, prometeu encaminhá-lo para uma escola de astronautas. Chegando lá, deram-lhe uma enxada, algo muito diferente da nave espacial com que sonhou.
Rejeitado pela sociedade e sem nenhuma perspectiva sua vida estava destinada à morte violenta ou passar a vida em algum presídio, talvez até fazer amizade com o Fernandinho Beira-Mar. Passou a roubar tanto que até os idosos e as gestantes não escapavam mais, até mesmo em pleno Natal.
Na Febem ao ser analisado por “especialistas” recebeu a seguinte classificação: irrecuperável. Caso perdido, perda de tempo e de recursos. A vida de Roberto Carlos mudou quando ele conheceu uma pesquisadora francesa (Marguerit Duvas) que buscava conhecer melhor a maravilhosa Febem. Quando ela ficou sabendo que Roberto Carlos havia sido avaliado como caso irrecuperável ela não acreditou que era possível condenar uma pessoa tão jovem daquela forma. Acolheu o garoto na sua própria casa aqui no Brasil e ofereceu-lhe educação. Roberto Carlos, cidadão brasileiro, foi alfabetizado primeiro em francês e então aprendeu o português. A francesa percebeu que o comportamento do “irrecuperável” era diferente dos garotos “normais” da sua idade, então adaptou os professores particulares para maximizar o aprendizado de Roberto Carlos. Aprendeu a ler e a escrever em alguns meses, coisa que em 13 anos não tinha conseguido.
A gringa tinha a visão de que todos somos diferentes e que essas diferenças devem ser respeitadas, assim como todos devem ter chances para terem uma vida digna, não só através da esperança e da fé, mas principalmente através da educação. E em entrevista recente parece que Roberto Carlos aprendeu essa lição ao responder se ele acreditava em pessoas irrecuperáveis: “Não. O que existe na verdade são pessoas que não foram entendidas, amadas ou oportunizadas adequadamente. O que falta muitas vezes nessas instituições é um grande exercício de tolerância. Quando você trata com o coletivo e deixa de lado a individualidade, gera esses desastres que acontecem com as Febems e Funabems. No terceiro milênio, infelizmente estamos vivendo isso ainda. Algumas instituições acham que podem trabalhar com dois, três mil alunos. Eu era um número, o 374. Muitos dos meus colegas me conheciam pelo meu número e não pelo meu nome, o que é muito triste.”

Recentemente foi divulgado que uma criança ganha em média R$500 por mês nos semáforos de São Paulo. Existe uma estrutura que acompanha esse tipo de atividade: a criança deixa de ir à escola, familiares e adultos através da violência física forçam ela a sempre voltar para casa com algum dinheiro e esse ciclo de miséria e subdesenvolvimento é continuado ou perpetuado.

Precisamos fiscalizar e valorizar os políticos bem como ONG’s que priorizam a educação e as inovações para combater esse ciclo de pobreza. Essa história de Roberto Carlos representa a esperança de que uma vida marcada pela miséria, drogas, violência e vida na rua, pode mudar e ser uma vida de desenvolvimento. Só assim conseguiremos atingir um nível de país prazeroso de se viver.

Para conhecer um pouco mais sobre Roberto Carlos: www.robertocarloscontahistoria.com.br

Ruy Hirano, 20, estudante de administração.

segunda-feira, abril 04, 2005

PORNOGRAFIA NACIONAL

Tirem as crianças da sala, do quarto ou de onde você estiver lendo este texto. Foi-se o tempo em que presidente da Câmara dos Deputados era um cargo meramente ilustrativo sem repercussão alguma. Sim, neste texto vou comentar um pouco da gestão e da personalidade do já famigerado Severino Cavalcanti.
No site da Câmara dos Deputados é possível encontrar algumas informações sobre Severino na sua seção pessoal. Originário de Pernambuco ele tem mais de 40 anos de carreira ininterrupta na administração pública. Começou em 1964 como prefeito de João Alfredo, depois foi deputado durante 28 anos e a partir de 1995 é deputado federal. Inclusive nas eleições de 6 de outubro de 2002 ele ajudou a eleger a sua filha Ana Cavalcanti para deputada estadual. Severino é o deputado federal com mais tempo de mandatos consecutivos (oito anos) na Mesa Diretora da Casa nos últimos 50 anos. Dentre as inúmeras propostas de lei e emendas à Constituição nestes 40 anos de trabalho, destaca-se a “Lei Carla Perez”, consideração da pratica do aborto um crime e a proibição da venda de brinquedos em forma de arma.
Passado pouco mais de um mês sob gestão Severino Cavalcanti a Câmara dos Deputados está mais popular do que nunca e vem mostrando muito serviço para a sociedade. Eis alguns destaques:
1) Inicialmente Severino tentou aumentar o salário dos deputados em mais de 60%, mas por enquanto não conseguiu.
2) Foi aprovado um aumento de 25% na verba de gabinete – de R$ 35.350 para R$ 44.187- o que provocará um custo anual de R$ 103 milhoes.
3) Severino empregou pelo menos oito parentes desde 1997, dos quais seis continuam trabalhando. Salários variam de R$ 1.687 e R$ 7.503. O nepotismo (facilitação a parentes na esfera pública) é considerado imoral, mas não há lei que a proíba.
4) Severino deixa claro que é contra a redução das férias dos deputados assim como outros favorecimentos que só aquele que está no poder pode desfrutar.

Severino Cavalcanti com todo o seu jeitinho brasileiro de 1º de abril vem ganhando o apoio de muitas pessoas como eu e você. Essas pessoas argumentam que Severino presta um serviço ao país ao revelar tudo escancaradamente o que os outros políticos lutam em esconder. Afirmam que assim todos podem ficar sabendo o que se passa nos bastidores de Brasília, como a troca de favores entre executivo e legislativo (troca de cargos por apoio no Congresso) e a pressão do presidente da Câmara para a nomeação de um de seus amigos.
Um desses satisfeitos com a atuação de Severino parece ser o jornalista Otávio Cabral que na edição da revista Veja de 5 de abril de 2005 escreveu uma matéria dizendo que Cavalcanti é o Forrest Gump made in Brazil e apesar de ele fazer tudo errado o resultado é bom. Ganha destaque o confronto entre Severino e o governo federal na batalha da medida provisória 232, segundo o jornalista a pressão da sociedade foi importante, mas Severino foi o trunfo brasileiro. Essa postura independente ou se preferir autoritária de não consultar os líderes e vez ou outra o líder do próprio partido, o PP, é elogiado e visto como algo que vem produzindo benefícios como a maior autonomia da Câmara dos Deputados em relação ao Executivo.
O presidente da Câmara ao tratar com naturalidade as intrigas políticas bem como contratar parentes com dinheiro público faz com que vejamos o errado dar bom resultado e passar a ser algo eticamente justificável. Tudo bem que é algo errado, mas se está funcionando por que não continuarmos? E assim vamos levando as coisas neste país, onde os Severinos da vida são vistos como criaturas inofensivas e até carismáticas dignas de nosso apoio. Por anda aquele anão barbudo com binóculos que certa vez foi eleito como o deputado federal mais votado? Ah, estou falando do Enéas. Tem algum eleitor dele que sabe por onde ele anda e o que tem feito? Aos admiradores aviso para não ficarem preocupados, pois com certeza em breve ele estará de volta no horário nobre para gritar conosco na telinha.
Política no Brasil precisa deixar de ser meramente um evento de marketing que ocorre a cada 2 anos. Os políticos precisam aumentar a transparência de gestão e apresentar resultados para aqueles que o mantém lá no cerne do poder. E os eleitores também precisam parar de acreditar em papai Noel e coelhinho da páscoa na hora de votar. Durante o período de exercício de mandato precisam acompanhar e cobrar a responsabilidade de seus representantes. Hoje podemos achar os Severinos uma figura inocente e engraçada, mas são eles que irão gerar o “crescimento sustentável” dessa pornografia do desperdício publico.

No dia 19 de março de 2005, foi reportado que o Palácio do Planalto está infestado de baratas, formigas e até ratos que ficam perambulando pelos corredores do poder. Acrescento que esses insetos também marcam presença na Câmara de Deputados e no Senado, assim como em órgãos do Judiciário e no Ministério da Fazenda. Nessa Ilha de Caras e Bundas chamada Brasília, a pornografia com o dinheiro público corre solta com os ratos Severinos e as baratas Cavalcantis, mas como destacou Gilberto Dimenstein na Folha de S. Paulo de 3 de abril a sociedade vem apresentando um progresso democrático através do acesso à internet. Por meio de e-mail’s a população vem manifestando maior participação na vida política através da expressão de insatisfação ou cobrança ao seu representante no governo.

Para aqueles que acham que política e políticos são a escória dessa nação, precisam aprender que é impossível viver sem ela e que países como os Estados Unidos tem mais de 200 anos de democracia enquanto nós apenas 20 anos. Se deixarmos a política ao léu, abandonada de nossas vidas, as coisas só tendem a piorar e mais Severinos irão brotar para sugarem o nosso dinheiro e nem perceberemos. Tudo depende de nós.

Ruy Hirano, 20, estudante de administração.